terça-feira, 22 de maio de 2018

Documento mostra preocupação de Figueiredo em relação a Tancredo


Texto da inteligência americana diz ainda que EUA consideravam terrorismo ações de militares linha dura contrários à abertura política.

Por Jornal Nacional, Globo

Novos documentos da inteligência americana revelam que os Estados Unidos consideravam como terrorismo as ações organizadas por militares contrários à abertura política, durante o governo Figueiredo. E que Figueiredo, o último presidente da ditadura, mostrou preocupação com a formação de um governo de Tancredo Neves como seu sucessor.

O conteúdo da conversa era secreto. Fevereiro de 1976, Palácio do Planalto, Brasília. No encontro, no governo Geisel, o ministro-chefe da Casa Civil, general Golbery do Couto e Silva, relatou ao então secretário de Estado americano, Henry Kissinger, que o processo em direção à democracia não poderia ser feito tão rapidamente.

Kissinger respondeu: “Vocês não sofrerão pressão dos Estados Unidos”. E Golbery afirmou: “Mas nós estamos sob pressão por causa da imagem de nosso país no exterior”.

Oito anos depois, um outro documento enviado a Washington por agentes da inteligência americana, baseados no Brasil, relata um encontro entre Henry Kissinger, que naquele momento já havia deixado o cargo de secretário de Estado, com o então presidente do Brasil, João Figueiredo. A reunião, em 1984, durou uma hora e 40 minutos.

Na conversa, Figueiredo contou que, naquele momento, as Forças Armadas estavam divididas em dois grupos: um que apoiava fortemente a volta do governo civil e outro que estava disposto a impedir o que via como um avanço da esquerda.

Kissinger também questionou se algo poderia acontecer antes ou depois das eleições, em janeiro de 1985. Figueiredo respondeu: “Sim, dependendo do desenrolar dos acontecimentos”.

O presidente repetiu na conversa que as Forças Armadas não falhariam ao compromisso de impedir, nas palavras dele, que esquerdistas tomassem o país, e que, se os militares tivessem que intervir, o país poderia ser levado a uma guerra civil.

Figueiredo classificou Tancredo Neves como uma pessoa capaz e moderada. Mas declarou: “Ele está cercado e apoiado por muitos radicais de esquerda e, quando assumir o poder, se eleito, não conseguirá controlá-los”.

Figueiredo ainda ressaltou a Kissinger que acreditava que as relações entre Brasil e Estados Unidos poderiam se deteriorar caso Tancredo Neves fosse eleito.

“O governo americano joga seu peso em favor de uma transição para o governo Tancredo. É isso que essa documentação mostra basicamente”, disse Matias Spektor, do Centro de Relações Internacionais da FGV.

Na eleição indireta, no Colégio Eleitoral, Tancredo Neves, candidato por uma aliança de vários partidos, derrotou Paulo Maluf, do PDS, sucessor da antiga Arena, partido de apoio do regime militar.

Tancredo não chegou a tomar posse, foi hospitalizado na véspera e morreu mais de um mês depois.

Em outro documento, de 1981, os americanos passam a se referir como terrorismo os atos contrários à abertura política, encabeçados por uma ala do regime militar.

Os agentes afirmam: “O terrorismo esporádico perpetrado por elementos da linha dura das forças de segurança - se intensificar ou persistir - vai enfraquecer a autoridade do presidente Figueiredo e reduzir sua posição política geral”. E que “os elementos militares responsáveis pelo terrorismo tinham dois objetivos: intimidar grupos esquerdistas cada vez mais visíveis; e, mais importante, interromper e retardar a liberalização política”.

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